domingo, 26 de dezembro de 2010

Para 2010 com carinho, assinado: meu nome

Esta é uma carta de despedida. Quero com ela despedir-me do ano de 2010. Quero com ela deixar que este ano esteja guardado no meu baú, aquele que emocionado abro pra sonhar meu passado. Não te disse ano que você foi pra mim meu recomeço, meu súbito estado de pressão, minha turbulenta freqüência de capacidades e de realidades daquelas que são colocadas, ou melhor impostas pelo destino, esse amigo e camarada que é do signo de Áries, teimoso, teimoso destino.
Ano, você sobreviveu, não acabou antes da hora, não sucumbiu, nem verteu seus rios pro óbvio planejamento meu, insano, insólito, infinito. Igual quando você choveu meu coração, nesse teu ciclo hidropassional que se renova aqui dentro, queimando, virando gelo, derretendo, chovendo e secando meu mar interno até só restar o sal.
Sabe ano, eu me moldei, você me mostrou tanta coisa nova, tanta coisa velha e tanta coisa nem nova nem velha que não servia pra nada. Você me chacoalhou e nem me avisou que iria me colocar com as pernas para o ar. Você ultrapassou o limite das minhas vertigens e jogou meu medo pra cima dos meus olhos me fazendo costurar meus sangramentos, logo depois que entendi que a luta não era combater você e sim suportar a dor do que você me escancarou. Algumas palavras passaram a ser apenas palavras como; escolhas, desejos, conseqüência. Ainda prevalece a velha história do semeador, às vezes a gente semeia mesmo nem pra gente mesmo, às vezes demora pra nascer, às vezes é preciso fazer as vezes de quem não semeia, de quem não acentua sua vida com vírgulas e reticências.
Quando você chegou fui meio frio, não tenho mais a mesma esperança dos meus dez anos de idade quando eu olhava os fogos e sonhava em crescer. Em ser parte deste mundo, em buscar afirmação artística que já estava dentro de mim. Eu deixei na infância o brilho nos olhos, o carinho do afago e a inocência de uma criança esperta e inteligente. A mesma inocência que me fazia sorrir quando um adulto me dizia que eu seria alguém muito importante. Talvez tenha ficado lá a atenção dada às tantas histórias da minha vó, a atenção ficou, mas o cuidado não, o cuidado eu soube manter, o famoso juízo que quase ninguém tem e a gente insiste em dar a quem precisa. Não foi assim, não recebi juízo e sim muito amor, atrás de um figurino da mais alta admiração. To falando que você se escolheu pra ser o ano da partida dela, minha força, meu cotidiano, minha esperança e minha luz nesse mundo estranho que não cabia na cabeça dela, ou estava pra lá de ultrapassado. Desculpa ano, mas nem a sua modernidade batia a sabedoria dela e seu catálogo de situações, todas tão vividas ao longo de tantos anos.
Aquela lágrima solitária ao pé da terra que abriga minha vó foi de missão cumprida, olha só que coisa, eu que tanto deixei coisas pela metade, consegui terminar a minha história com ela com a sensação de muito crédito. Nem devia a ela e nem ela a mim. Ela foi com Deus, conhecer seus Jesus Cristos, suas Nossas Senhoras, seus São Pedros, seus tão apaioxonantes protetores desta vida que confortaram suas preocupações de mãe, mulher, profissional, chefe, avó, bisavó, irmã, tia, anjo. Se você puder me ajudar a gritar ano, ecoa um grito forte de gratidão que assim de onde ela estiver, ela ouvirá um "obrigado meu amor" com a minha voz.
Cresci e descobri o preço desse crescimento. Foi como da noite pro dia não caber mais nas roupas, não entrar mais nos sapatos, não falar com a mesma voz. Crescer no sonho era habitar um mundo de possibilidades que não são impossíveis, mas menos possíveis talvez, aos olhos de uma criança.
Não sei como falar, mas não senti firmeza nas relações humanas, não me surpreendi na beleza das situações, somente me decepcionei com a pobreza dos pensamentos, com a hipocrisia e com a sede de poder ter poder. Não fui além da conta pra receber tanto descaso, tanta indiferença, tanto rancor. Se você puder, brevemente, dar um recado ao ano que vem, peça a ele que mostre pra gente, o valor que gente tem. Não fazendo gente endeusar gente, mas sim fazendo gente se livrar do julgo de gente.
A beleza das relações está justamente na liberdade que cada um tem pra ser o que quiser. Pra pensar no que der na telha, pra ser feliz, pra cuidar da sua própria vida o que já é algo, como habitualmente digo, muito difícil.
Ano, não acabe sem antes se despedir de mim, vamos fazer as pazes pelos momentos ruins, levando em consideração que a gente cresce com eles também e transferir pro próximo ano, os acertos, os momentos únicos, as horas de risos e reflexões sinceras, os encontros, começando pelo nosso e a despedida que faremos inteiros assim como montanhas instransponíveis.
Não te prometo nada além de um bom lugar, porém você precisa me prometer que vai mesmo me ajudar a não repetir os vícios, os erros e os desesperos.
Se você me permitir gostaria de cantar uma canção que diz assim

É de manhã, vem o sol
Mas os pingos da chuva que ontem caiu
Ainda estão a brilhar,
Ainda estão a dançar,
Ao vento alegre que me traz esta canção.
Quero que você me dê a mão
Vamos sair por aí sem pensar
No que foi que sonhei,
Que chorei, que sofri
Pois, a nossa manhã
Já me fez esquecer.
Me dê a mão vamos sair
Pra ver o sol.

E assim com Tom Jobim me despeço e te entrego esta carta, onde humilde assino
Com carinho
meu nome

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