quinta-feira, 30 de dezembro de 2021

last mas

muito provavelmente 
não verei seu aceno
não lerei seus diários
não darei saudações

é possível que nunca mesmo eu me aproxime
tudo depende do acaso
vontade não falta
coragem já não tenho mais

não te encontro mais em músicas
não te vejo mais de jeito nenhum
fica então essa fantasia
um gesto 
a mania
de voltar aqui

eu estive tão errado sobre tudo aquilo
um passado que dói
ao invés de orgulhar

segunda-feira, 27 de dezembro de 2021

encontre

onde estará?
por onde vai?
será que pensa?
será que vê?

sumo no mundo
no mesmo lugar
tudo ainda fundo
tudo a fundar

respiro,
verdade
afogo,
saudade

coisas que foram mexendo por dentro
não avisam se vão me deixar
gritam suas dores, vontades, clamores
não mais, não dizem mais

se quiser,
às 20h na praça,
me encontre

estarei rasgado



sexta-feira, 3 de dezembro de 2021

supor te

para dar um olhar atento
para ser mais
vir e dizer
tudo quanto mudou
são tantos pontos
são tantas partes
tudo quanto foi sendo deixado para trás

pode-se quebrar em quantas partes um coração?

fragmentos
cola
colocação 
pinos
pontos
parafusos
pregos
presilhas
prendedores

erguer a cabeça

fixa
fixada
suportada
por um dia
após o outro

domingo, 31 de outubro de 2021

antes de dormir

todo dia antes de dormir
vou à janela 
olho o horizonte
inspiro
me inspiro
exalo coisa boa
penso, conecto
hoje,
especificamente hoje,
o céu com nuvens
o clima úmido
depois de um dia chuvoso
o friozinho
abrindo, prazer
sempre fiz isso
preciso
já morei em janelas sem horizonte
nunca foi necessariamente um problema
podendo, porém,
escolho estar alto
atravessado de vento
mais perto das nuvens
com a sensação
ah a sensação
de ter o horizonte pra tocar com o olhar
atravessá-lo fica sendo apenas uma questão de tempo
inspiro, me inspiro
olho estrela
olho chuva
olho no olho
olho pra mim
há dias sou feliz
o chão molhado me deixa assim
fértil
o eu na janela
vale o dia
o dia vai
e a sensação é que amanhã
serei o melhor que eu posso ser
farei tudo quanto poderei fazer
na janela, o poder vem
e vou dormir
ou sonhar
antes de dormir

domingo, 17 de outubro de 2021

quarta-feira, 29 de setembro de 2021

tratar de tratar

tento não querer 
tento não pensar

descubro todo dia
que o espaço não me prende
que o tempo não me prende
que o espaço não me preenche
que o tempo não me preenche 
que o espaço não me entende
que o tempo não me entende

são setas contrárias
as que são idas
as que são vindas
as que são ímãs 
as que são vidas
as que são sinas
as que são vias

as mesmas que eu já inventei 

trovas baldias 
afirmações sectárias
uma coisa nenhuma
algo de senso comum 

todo dia queimo o eletrodoméstico
a hora mais bonita é o passeio 
voltagens de anseios 
meios, partidos ou quase um
fotos boas, mamilos nus 
tratar de dar modelos
tratar de morder 
tratar de tratar
de trazer
duas coisas
o teletransporte 
e… adivinha?


sábado, 25 de setembro de 2021

bateu

corri ali na janela
bateu vento fresco
olho pro horizonte
como quem enxerga o futuro
ainda faz calor

bateu vento fresco
preferia que chovesse
e eu dormisse bem

li três livros de Freud
pra poder usar pulsão

os tapetes não estão mais na sala
nem todos os tapetes podemos bater na máquina

você não quer mesmo saber como estou?

bateu vento fresco
o meu vizinho tossiu
tenho uma cachorra chamada Maria

bateu
vento fresco
sono
e tudo mais

domingo, 5 de setembro de 2021

não fazer mais um poema falando de você

hoje eu vi uma pequena aranha tentando comer uma mosca
a mosca era maior que ela 
se eu espantasse, interferia na natureza
a mosca, todos sabemos ser chata
a aranha ficaria sem comer e a mosca a encher 
quando eu era criança eu vi um mosquito cair numa teia
a aranha veio e sugou o interior do mosquito como um milkshake
hoje não havia teia, estavam sobre a pia da cozinha
a aranha deu uma chave de asas na mosca
preferi não ver a aranha tomar seu milkshake dessa vez
não sou capaz de dizer se ela conseguiu
não sou capaz de me compadecer por completo da mosca
esses tempos dei de usar raquete elétrica contra elas também
tem pernilongos que não morrem com o choque
intuo que eles se tornam mais fortes e mutantes
tudo isso pra não fazer mais um poema falando de você

terça-feira, 10 de agosto de 2021

mo(n)stro

lembro

o lenço de sangue

a paisagem imitando os laços

o sentido contrário

o avesso do curso nosso

prosas infindas perscrutando a intimidade

vezes sim

vezes não

o sintoma do já dado caso de posse por domínio

colonizados os corpos, os topos, os vícios

toque de pele ou de caixa

a rapidez da re(L)ação

essa sim, expressa

instantânea

o ataque da língua 

e o verter de ódio

ao invés de lágrimas

o soco no peito

o esbarrão

e o chão

sem mover um só dedo

mas movendo montanhas

apenas pela força do gesto

palavras teleguiadas

palavras lanças

um jogo estranho 

do tipo que não se aprende enquanto joga

uma obra de temática única

uma realidade não esperada

uma confusão jamais vista

um abismo de "Niti"

que eu não olho mais

mas que me olha 

dentro

bem dentro de mim


quinta-feira, 8 de julho de 2021

beijo na planta do pé

o tempo tem me dado lições firmes
o medo tem me dito coisas fortes
ontem eu era eu, hoje um joão bobão
apenas me chute
com suas botas firmes em couro
apenas me use
com seus cínicos dons de ouro
um trunfo
um truque
e um dissabor
um fundo
um vagabundo
e o que for

teimou que seria
mas vem o degrau

tomou para azia
mais um sonrisal 

há que se escolher
quem mais vai entrar
deixar para trás
o pensar do que já não é mais

imagine se um dia nesse canto floresça
um jardim vertical com tudo que mais cresça
vai ser muda e mudinha de todos os gostos
vai levar pra casa
vai levar a sério
vai plantar os pés
das sementes que pegou aqui

sábado, 12 de junho de 2021

Me ruma

Perco o foco do teu rosto e te quero como foto uma pessoa que já não existe mais

Passo os olhos nos teus olhos, gesticulo, aceno, mas só o que ouço é mais um suspiro que ruma em minha direção 

Me toma e me rima o interior 

Me ama e me devolve ontem, amor

Sem coragem sem convite 

Saiba

Ainda

Estou 

Aqui

segunda-feira, 17 de maio de 2021

contrários, avessos, opostos

dias difíceis
de escorrer
dias grandes
curtos de ser

talvez eu tenha me deparado
talvez eu não queira aceitar

as traves
pra bater
as praias
pra morrer

loopings gigantes
rodas
vens repetitivos
para vais 
fodas

contrários
avessos
opostos

terça-feira, 20 de abril de 2021

Toques de recolher

podia ter passado
ido sem retorno
como um música
repousa física
sobre a memória
onírica que é lembrar
você

são mais noites do que eu pensei que pudesse suportar

teria algum sentido
teria ferido
tal arranhado
que o emaranhado
do que sou eu
se transformou
ou

tropeços no tapete imaginário que você levou

para criar espalho
e fico por baixo
de onde cai os cacos
monto mosaicos
nem mandalas, guirlandas
nem arabesques 
eu

cinema mudo, uma frase roubada: silêncio abissal



de nascer

quem quiser  quem for ver vai dizer que o tempo passou voando não vai mentir vai sentir um vento na cara, natureza talvez sorrir parece que ...