terça-feira, 1 de outubro de 2019

Mais uma

É que tudo se torna gatilho quando a gente está frágil. E tudo se torna frágil quando as certezas se vão. Eu era tão cheio delas, hoje não. Percorri teu bairro como percorri teu corpo, mas não te achei nem aqui nem em lugar nenhum. Subi as escadas que davam pra tua janela, não vi a olho nu, nada. Eu estava acostumado a falhar no luto, relutar. Em meio segundo eu já perdi a inspiração, me perco como em tudo nessa vida. É disso que eu tô falando. Desse foco que não sai do seu país, do país você. Esse blog era, inclusive, em primeira pessoa. Agora ele é o quem tem, onde se vem e diz, apenas solta, desmancha-se em palavras, em letras e finalmente as engole, porque jamais as ousaria dizer por aí. Anos, meses, horas e tudo mais que vai ter que passar pra eu ter coragem de olhar com sinceridade pra mim mesmo no espelho. Esse melodrama, esse sofrimento contido, essa angústia disfarçada de poema e esse lençol testemunha do que antes podia se chamar de amor e hoje de todas as tentativas de recuperar o tempo perdido. Eu me sinto uma rua esburacada por onde os carros passam e se estropiam, por onde os homens maus passam e se irritam, os homens maus me xingam, cospem, esbravejando com ira minha existência. Eu sempre fingi auto-estima, eu sempre fingi sorrisos, eu sempre fingi que não ligava e olha no que deu. Agora nem os pássaros vem cantar na minha janela, eles gritam e eu grito, sangro e escorro pra ser bem fatalista. A corda continua bamba, as músicas continuam sendo feitas, as bandas continuam existindo e os gatilhos continuam disparando o terror na minha cabeça. Cercado de tanta confusão eu vou percebendo quanta miséria eu evitei presenciar na vida. E o pior, descobri que aqueles medos que a gente mais sente, acontecem. Eu sou meu próprio tribunal, minha própria justiça, minha própria sentença, sou inegavelmente responsável. Miseravelmente responsável, irritantemente responsável, talvez seja um pouco isso a causa de tanta junção ter se transformado no mais completo apartheid. Agora que outras músicas já, obviamente, fazem parte de um novo repertório de encontros percebo a frieza de Coldplay, um gatilho frio e cirúrgico dessa arma química localizada dentro da minha cabeça que, ao disparar, me faz lembrar de você.

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